terça-feira, 21 de setembro de 2010

Crias em casa, provação

Um problema de viajar com criança é grana. Criança paga que nem adulto em qualquer lugar. Pra filho de jornalista com professor tem que planejar muito pra conseguir juntar e ficar uns poucos 20 dias, esticando bem, na trip. Dá pra economizar; usar barracas, fazer a própria comida, evitar centros muito urbanos e turísticos. Mas se vive muito bem com muito pouco, e quanto mais acostumar os pequenos com esse estilo de vida, no dia a dia, em casa, mais fácil fica levá-los a tiracolo pro mundo. No caso da viagem pra longe, a grande despesa são as passagens aéreas. Estar lá, se manter, é fácil, o difícil é ir. É a afirmação plena dos governos dizendo pra gente: "Seus trouxas! Metade do que vocês ganham com suor e batalha, é nosso!" Imposto é absurdo.

Sempre melhor cria na estrada junto, mas cria em casa esperando também tem suas vantagens:
  • Os pais podem exigir-se mais fisicamente, testando os próprios limites;
  • Menos gente, menos diferenças de humor; 
  • E a saudade. Saudade alimenta a importância que o outro tem pra nós.
Só essas. Porque é milhão de vezes mais difícil pro mental. Saudade dói, e se dói! E a sensação de estar vivendo uma coisa maravilhosa, e querer que quem você mais ama esteja junto, é terrível quando não concretizada. Uma provação pra mente, uma mistura de arrependimento, com devia-ter-dado-um-jeito, com eles-precisavam-muito-ver-isso, com a incerteza de um dia poder voltar. A vida é assim.

Sem poder perder a chance de Peru e Bolívia, com pouquíssima grana, fomos nós, eles ficaram. Foi a primeira vez. Tanto tempo. Dezessete longos dias, caminhando dia e noite, com o coração apertado e uma certeza gigante de querer junto, de querer bem, de amor em sua plenitude. Amor sem tirar nem pôr.

Nem é preciso dizer sobre a vontade de voltar, nos exatos mesmos lugares, pra compartilhar os olhares infantis. E agora, a gente tá em casa. Em meio a uma das trilhas - Machu Picchu, por Salcantay, 5 dias e 4 noites- já fazíamos o planejamento de como seria na próxima, com as crias. É possível. É possível MESMO. Você tem que adequar o ritmo, e as condições (alugar cavalos por exemplo), ter um pouquinho mais de paciência, roupa quente e comida. O resto é resto. Aliás, o resto é imensidão.


Sofrimento é bom pra mostrar que a gente aguenta. E como. Temos uma força que desconhecemos, que só aparece quando exigida. Pero... pra evitar transtornos e desmoronamentos, lá pelo terceiro, quarto dia, cada vez que via família com criança, Denis, meu companheiro, me apontava algo no céu ou no outro lado pra desviar minha atenção. Sem chance. Instinto materno como um imã, e rola lágrima no rosto. Sem desespero. Só saudade, sabe?


Oi vida.


Você não diria que seus filhos PRECISAM ver isso?
Sim, eles precisam.
Eu choro de emoção, de alegria, de esperança de um mundo possível.



... um mundo mais simples, mais sincero, mais momento presente.
Família 1, franceses: pai, mãe, filha de uns 14, filho de uns 12. Se revezaram com os dois cavalos e com as oito pernas... 
Família 2, franceses também. O casal fez o percurso uma vez sozinho e estava repetindo com as crias, um de onze, um de catorze, que estavam estudando inglês e começando no espanhol. Cultura da mochila.

Se alguém precisar dicas sobre o percurso só pedir. É tranquilo. Se eu pudesse dar um conselho seria, DÊ UM JEITO de levá-los. Se eu pudesse voltar atrás teria vendido alguma coisa desnecessária de casa (temos tantas!!!), pedido aos avós de presente de Natal; feito bingo na escola. Ter menos pra viver mais. E se a gente começar agora, nesse exato momento, não consegue ver tudo. Desapega de pequenas coisas, de acumular tranqueiras, pra alcançar um bem maior: estar na estrada, só estar, sem querer chegar, curtindo o caminho... e educando os pequenos na prática. 

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